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Agricultura

Jurema tem propriedades psicoativas e é comum no Nordeste brasileiro

A jurema é um arbusto muito difundido no litoral brasileiro, embora sua madeira seja pouco utilizável

A jurema, planta pertencente à família das leguminosas, bastante comum na região Nordeste, apresenta interessantes propriedades psicoativas. Sua família possui algumas espécies comumente cultivadas para a alimentação.

Além disso, a jurema exerce uma importante função ecológica. Afinal, ela abriga diversas espécies de microrganismos nitrificantes, isto é, capazes de fixar o nitrogênio no solo.

O que é jurema?

Jurema é um termo que serve para designar distintas espécies de leguminosas integrantes dos gêneros Pithecellobium, Acácia e Mimosa. Cita-se, neste último gênero, a Mimosa tenuiflora, a Mimosa verrucosa benth e a Mimosa hostilis benth.

Por sua vez, no gênero Acácia, é possível identificar a Acácia Jurema ou Acacia piauhyensis benth. Com efeito, diversas espécies pertencentes ao gênero Pithecellobium são, também, designadas pela mesma nomenclatura.

As classificações populares distinguem a jurema preta e a jurema branca. Para o célebre pesquisador e estudioso Sangirardi Jr., a distinção correta de cada árvore jurema é:

De acordo com o cientista, entre as espécies denominadas de jurema, encontram-se:

A família das leguminosas abriga, além da jurema, cerca de quatro espécies. Estas apresentam compostos psicoativos em suas conformações bioquímicas, entre as quais:

Sem embargo, certas variedades de Acácias australianas do tipo Acacia maidenii possuem, também, propriedades que se assemelham às da jurema.

Composição fitoquímica

Nas raízes frescas e casas da jurema (Mimosa hostilis) foi identificado, em 1949, a presença do alcaloide nigerina. Esse elemento foi posteriormente identificado como alcaloide indólico (DMT, ou seja, dimetiltriptamina), uma substância altamente psicodisléptica ou alucinógena.

Com os vegetais que possuem DMT – derivados da triptamina e o núcleo indol –, como é o caso da jurema, é possível fazer uma perigosa combinação com os derivados da harmina. Esse fato foi identificado na Ayahuasca sul-americana. A combinação é realizada tanto com a Chacrona (Psychotria viridis) quanto com a Mariri (Banisteria caapi).

A harmina foi identificada, também, na Passiflora (Maracujá) e no Peganum harmala (Syrian rue), plantas tradicionalmente utilizadas de forma independente.

Combinações em ritos indígenas

Alguns estudiosos chegam a afirmar que algumas variedades de maracujá foram sistematicamente usadas em combinações com a jurema. De fato, segundo os pesquisadores, combinações altamente psicoativas foram recentemente feitas com a jurema em celebrações rituais dos povos Xucuru, habitantes do estado de Pernambuco.

Não obstante, a utilização da jurema na região Nordeste tem gerado registros e referências de empregos e misturas diversas. Sabe-se, portanto, de preparações envolvendo a extração alcoólica das raízes e cascas da jurema, com água (por maceração ou decocção da folha de jurema) com ou sem fermentação.

A literatura científica registra, inclusive, a combinação da jurema com a Brunfelsia uniflora (Manacá). Para os estudiosos, essa é a combinação mais perigosa de todas, uma vez que tudo indica que ela tenha sido usada na Manifestação Sebastianista, resultando em psicose coletiva.

O elemento ativo da Brunfelsia uniflora é de natureza analgésica, anestésica e psicoativa, além de potencialmente simpaticolítica, configurando-se em um forte anticolinérgico ou atropínico.

Quando combinada com o Syrian rue, a jurema pode ter um efeito parecido ao de sua combinação com o maracujá. Afinal de contas, ambas as plantas apresentam substâncias muito semelhantes.

As combinações com maracujás silvestres ou maracujás do mato podem, até mesmo, ser o “segredo perdido” (crença presente em certas culturas indígenas que vaticinam a chegada do homem a um estado de consciência que o liberte das agruras terrenas).

Tal crença não é, porém, totalmente injustificada, à medida que a família Passifloraceae (da qual o maracujá é o membro mais ilustre) possui cerca de seiscentas espécies disseminadas por todas as partes do mundo e seus dezesseis gêneros ainda não foram totalmente estudados.

Vinho de jurema

O vinho de jurema, tão comum nas umbandas e nos catimbós, possui receitas secretas para a sua preparação. Algumas delas contam com a presença de alho, alecrim, sangue de aves, mel, cachaça e vinho branco.

Na medicina indígena, as formas de consumo da jurema envolvem o seu uso simultâneo com:

O vinho da jurema, preparado, conforme mencionado, a partir de distintas variedades da planta jurema, tem sido costumeiramente consumido pelos remanescentes indígenas e caboclos brasileiros.

Seus efeitos foram detalhadamente descritos no romance Iracema, de José de Alencar. A despeito de ser amplamente conhecido no interior de nosso país, o vinho da jurema é consumido nas grandes cidades apenas durante os rituais de candomblé e em ocasiões especiais, como na passagem de ano e outras datas festivas.

Efeitos da jurema

Para compreender os efeitos da jurema, não basta avaliar sua composição molecular e compará-la com as chamadas drogas alucinógenas. Antes, o pesquisador ou interessado leigo deve se situar no contexto das expectativas e formas de uso dessa substância.

Embora seja óbvio que as drogas psicotrópicas comprometam o sistema nervoso humano, esse fato não pode ser associado a elementos como:

Embora existam similaridades entre os relatos envolvendo a utilização dessas substâncias e as descrições de êxtases religiosos, psicoses e estados oníricos, as pessoas não perdem a consciência de seu uso ritualístico. Isso, por si só, reduz significativamente seus efeitos e usos.

Aliás, a atuação de entidades civis e grupos religiosos tutelados pelo Estado Brasileiro conseguiram preservar importantes elementos que nos ajudam a conhecer, pelo menos, um pouco mais da rica história que os europeus tanto se esforçaram em apagar da memória coletiva.

Ademais, os índios nordestinos, apesar dos processos de integração forçada à sociedade eurocêntrica, conservam, em certas localidades, religiões organizadas que insistem em sobreviver.

A persistência da utilização da jurema em religiões populares e rituais indígenas do Nordeste brasileiro, apesar de duramente combatida pela colonização católica, indica sua relevância farmacêutica.

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